Outro dia mesmo estive num debate político eleitoral, em uma universidade. Isso ocorre uma vez a cada quatro anos, contudo, respirava o ontem e o anteontem. Quando um homem – que também sofria com a peste – subiu ao palco para informar que o debate iniciaria em uma hora, decidi ir à biblioteca. No caminho meus passos zumbiam nos ouvidos dos desavisados. Do lado de fora do debate a vida parecia caminhar trôpega, costumeiramente (não que a vida estivesse no debate). O evento no campus pressupunha que a esperança não estava morta, mas sim que a velavam viva.
Na biblioteca não foi diferente. Havia um homem, duas mulheres e um silêncio transgênico. Ali a vida era cortante, desafiadora, oleosa. Era preciso cuidado para não ser olhado de soslaio, principalmente postulado como ignoto. Sempre que entro num vácuo tácito, com mortos de diferentes nacionalidades ajustados em prateleiras e uma obsequiadora, lembro da metáfrase do Criolo (originalmente de Chico Buarque): “Os saraus tiveram que invadir os botecos, pois biblioteca não era lugar de poesia. Biblioteca tinha que ter silêncio, e uma gente que se acha assim muito sabida.”
Assim me sinto em relação à vida: casualmente me faço, mas num sopro me desfaço. As pessoas do campus pareciam não se importar muito com o debate – não por enjoo político –, pois a praxe as fez não servir ao evento. Permanecer imerso no bafo do dia sem um diálogo sustenido soa mais interessante que assistir a homens de marfim.
O ócio é a conjuntura entre mim e o dia. As máquinas e as fábricas anunciam – como pano de fundo – que um novo sol, uma nova nuvem, um novo vento, cobrem uma vida sempre igual. Acordar, comer, trabalhar, voltar, comer, dormir. Acordar. Dormir. Não dá mais, vou-me embora pra Pasárgada.